quinta-feira, 12 de abril de 2012

MALDITA CHAMPANHA - Capítulo 12


Capítulo 12

Paulo espera Marina em sua sala. Ela entra, sandálias da faxineira arrastando no chão. Marina, querida, o chefe a bajula mais que o normal. Ela sabe que ele sempre teve uma quedinha por ela, ou por comer ela, coisa que ela imagina, mas não tem certeza. Ele tem. Marina, recebi agora um telefonema de nossos clientes. Eles querem almoçar para acertar alguns detalhes mas eu acredito que querem fechar o negócio. Então, a tua presença é muito importante. Pode não parecer profissional, mas a tua apresentação foi tão envolvente que até eu mesmo me convenci que eles tem que ser nossos clientes. Não sei daonde tu tirou essa força de convencimento, nem quero saber, Paulo imagina, como todo homem sempre pensa, que Marina deve é estar sendo bem comida, afinal, na cabeça dos homens se passam pensamentos assim, do tipo, fulana está de mal hoje porque não trepou ou faz tempo que não trepa, ou seja, é mal amada. Marina não era mal amada. Marina não era nem amada. tinha casos esporádicos. Que soubesse ela nunca apareceu com um mesmo namorado em duas festas seguidas da agência. Marina é fogo, pensa Paulo. e continua, portanto, quero que tu saia comigo daqui a pouco para este almoço e continue no mesmo clima, entendeu?

Respiro. Caralho, porra! Calma. Não é uma boa hora pra se estressar. Não conta nada pra ele da história do João, do assalto, do carro, do sapato, do gostosão. O gostosão! Sim, Cocó, quer dizer, Paulo, claro que eu posso almoçar com os espanhóis. Será um prazer terminar minha explanação, afinal, se pegarmos essa conta, será nossa maior conta e imagino, não falo, imagino, que eu também ganhar um aumento, não é? Óbvio que ele não vai responder, me embromar, me encher de presentes e regalias, mas aumento, o de sempre. Aumento de trabalho que publicitário é um tipo de escravo do glamour, entendem? Não? Olha só, não tem dia, não tem noite, não tem hora extra. tem a loucura do chefe, a nóia dos clientes e o saco de aturar os terceirizados. Tudo é um caos. Como eu depois de uma garrafa de champanha. Talvez por isso eu beba. Não tenho namorado. Não tenho amor. Não tenho vida. Claro que sim, Paulo, vou retocar minha maquiagem e volto.

Retocar com o que, cretina? Não tem como retocar. Não tem pra quem pedir. Não tenho bolsa, não tenho nada. A bicha! A bicha do cafezinho. Quer dizer, eu sempre encontro no cafezinho. Ele nem trabalha aqui comigo, trabalha em outra sala. Mas é uma bicha amiga do atendimento. Amo ele. Todas mulheres amam bichas amigas. Amar mulher amiga é outra coisa. Mulher é mulher mas sempre pode te trair. Bicha também pode. Mas não é mulher. Pode tentar pensar como uma. Uma mulher pode pensar como bicha. Mas pensar como mulher? Nem o narrador quando tenta se passar por mim, esse machista de merda. E nem tenta interferir agora, babaca. Sou eu e o Quico, minha bicha. Sim, todas nós temos uma vez na vida uma bicha. Hoje o Quico é a minha. Quico não está no café. O procuro na sala. Está saindo do banheiro, os olhos fundos, como se tivessem sido enxugados depois de uma choradeira de súbito.

Que foi Quico? Não foi nada, não. Eu ainda meio nervoso, o Lucas, o namorado do Quico, agora ex, como ele vai me explicar, me largou. Assim, sem mais. Nem menos. E eu fico parado pensando e não lembro o que posso ter feito para que ele terminasse comigo. Terminou porque homens idiotas terminam por nada, Quico. E falava assim, como se Quico fosse a mulher e Lucas, o homem. Talvez fossem. Como ela disse, eu não entendo nada. Marina pega em suas mãos e pede que ele leve sua bolsa junto. Quico não tem problemas em carregar uma enorme bolsa. Não é uma bicha-mulher, quer dizer, se veste de mulher. É apenas um pouco mais espalhafatoso que o normal e adora uma maquiagem. Aquela coisa Boy George, menina-homem, sabem? Pois levei a bolsa e disse. Quico, eu horrível e tenho uma reunião mega-super-importantíssima, então, olha aqui, tu me ajeita a cara agora e me deixa "a" mulher que eu tenho que destruir corações e arrebanhar bolas sob meu domínio. Ele entendeu o recado. Quico sabe tudo, ele até ajuda na maquiagem quando pinta uma sessão de fotos. E, além do mais, é minha única, único, amiga que carrega junto o estojo de maquiagens. Com demaquilante, claro. Imperdoável não ter um demaquilante. Fico o óbvio maquiada sem parecer. Alguém para o gostosão chamar de seu. Esquece. Capaz dele gostar do Quico. É tão bom que deve ser gay. Os melhores homens são todos gays.


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