segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

O Fator Oasis - Como ser Pop, Sujo e Mal Educado

Claro que daí carinha vai perguntar porque picas estou falando de Oasis aqui. Sim, Oasis, aquela banda que terminou onde habitavam dois irmãos, os Gallagher. Pois bem, dois quase analfabetos que se jogaram no mundo pop mesmo que quisessem ser jogadores do Manchester City e que se tivessem nascido no Rio de Janeiro teriam sido adotados por algum dessas ONG que transforma todo mundo em percussionista do Olodum. Só que para nossa literatura pop eles interessam.

As letras de suas músicas falam de amor, ódio, bebedeiras, drogas e falta de perspectivas. Peraí, meu, Tim Maia também escrevia sobre isso. Sim, Tim Maia também. E ele era muito diferente dos Gallagher? Não. Tim Maia mesmo declarou certa vez ao escutar Ed Motta: "Esse guri tem que ser corneado. Aprendar na vida. Sofrer. Depois escrever letras sobre isso." Enfim, tem que viver. Por mais grudenta que você considere uma canção do Oasis, e são, e eu gosto, elas falam dessa desorientação do ser urbano contemporâneo. Não falam por falar. Falam de dentro. E isso não se nota escutando, somente pegando a técnica da música. Não. Se sente. Como sentir milhares de quilômetros de distância? Não sei.

Aliás, sei. Keith Richards nos diz que para aprender a tocar blues ele descobriu que não adiantava ser negro. Ele tinha que se sentir negro. E foi assim, levando porrada, sendo negro no sentido mais perverso da expressão, que ele aprendeu. Não que eu queira que vocês sofram, mas boas histórias não nascem de bons sentimentos. Boas histórias nascem do sangue, da dor, da raiva, até mesmo do amor, mas do amor destruído, não correspondido, malfadado, proibido. Boas histórias são bastardas.

Então, caro amigo, se você for verdadeiro sendo sujo e mal educado, tal qual um troglodita dos Gallagher, caras que têm alma debaixo daquele carapuça midiática de malvados, você estará sendo pop. O pop não cresce em geladeiras. O pop cresce na sarjeta. É uma erva daninha. Um rato de esgoto. O pop é sujo. Mas faz bem à alma.



Ou vá escrever auto-ajuda.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Todo Romance é Histórico

Nós, escritores urbanos da América Latina, brasileiros no que nos interessa, devemos tentar ao máximo escaparmos de associações históricas e localistas com que nossos críticos (se é que eles ainda existem) e os estrangeiros analisam o que captam de nossa literatura.

Obviamente o que mais saiu da América do Sul, fora Machado de Assis, foram os incautos escritores de literatura fantástica. Falo incautos porque se soubesse onde estavam entrando, não tinham entrado. Pegarei como exemplo quem eu realmente gosto de ler o que escreveu. Julio Cortázar. Pois bem, Cortázar escreveu histórias com situações absurdas, das melhores, mas também escreveu belos, odeio este adjetivo, vamos mudar, ótimos contos que se passam em Paris, Buenos Aires, etc. e são histórias urbanas, de pessoas que se amam, brigam, trabalham, bebem, etc. Só que o resenhista, maledicente e preguiçoso, lembrará apenas de suas histórias fantásticas onde homens repetem números ou criaturas coabitam em um universo paralelo.

Quando for escrever sua historia, partindo do pressuposto que você é um escritor, pode ser que uma vontade imensa de fazer com que uma mulher voe ou que tenha uma chuva de Cadillacs na cidade aconteça em suas histórias, controle-se. Pode escrever. Mas contenha-se. Não deixe que o fantástico entranhe em você e o resenhista filho da puta e mal pago acabe com sua carreira de escritor o jogando no limbo da literatura latino-americana.

É muito fácil ele fazer isto. É simples. Se você é um mulatinho ou um hispânico, claro, que não tem uma vida urbana ou histórias para contar como quem vive em New York, Paris ou Londres. Isso é o que eles querem que você pense. Mas tem. Seja em São Paulo, Cuaibá ou Garanhuns. Vivemos numa sociedade urbana. Deixe os romances históricos para os roteiristas da Globo. Aliás, estabeleça uma nova ordem nessa porra toda. Todo romance é histórico.

Claro que sim! Se eu escrevo agora uma história que se passa em Porto Alegre com linguagem dos anos 2010 de Porto Alegre e locais, pessoas e situações urbanas de Porto Alegre desses anos, é um romance histórico. Ainda não é. Mas se sobreviver aos bits e bytes do futuro, será. Todo romance é histórico. Mande aquele cara que estuda, e ainda bem que ele estuda, e escreve um romance sobre a Revolução Farroupilha cagar no mato se ele se auto-proclama superior.

Acredite, existem escritores que só consideram alguém escritor se tiver lançado um romance. Vou contestar mais adiante o quesito lançamento, assim como os quesitos editoras, impressão e outros, pois a literatura pop pretende transcender, na verdade se apropria da transcendência que já acontece, estes conceitos estanques e paradigmáticos do escritor contemporâneo. Escritor é quem escreve. Assim como guitarrista é quem toca guitarra. Se ele só toca covers, toca mal ou faz péssimas melodias, foda-se, mas ele é um guitarrista.

Assim você também é um escritor quando se propõe a criar uma história fictícia, baseada em fatos reais ou não, com acontecimentos plausíveis ou impossíveis ou inexistentes, dane-se, você criou um universo através das letras assim como um compositor, um pintor ou mesmo um web designer criou um mundo próprio somente com a imaginação. Quem coordena tudo, ainda, é a imaginação. A técnica é, e sempre será, técnica. Mas boa parte do que chamam técnica nasceu de transgressões às técnicas anteriores. Basta não se deixar cair nos guetos. A literatura fantástica ou o romance histórico são alguns deles.


Visite os guetos. Mas não more lá. Ou tente não morar.

A literatura pop agradece.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Mate o Machado de Assis Que Existe em Você

Sim, se você já está enturmado com o pessoal das letras, ou da literatura, ou simplesmente você acha que faz parte disso, ou de algum movimento (que não existe), já escutou mais de algumas (muitas) vezes os outros (e até você mesmo): "Ah, mas é Machado". A intimidade permite que você, e os outros, tratem Machado de Assis assim. Simplesmente Machado. É preciso que você termine com essa promiscuidade.

Claro que tem aqueles que falam em Joyce. Se você for muito novato no assunto, afinal estudou em um colégio normal brasileiro, aquela coisa, O Cortiço, A Moreninha, deve imaginar se estão falando daquela cantora que sua mãe ou sua avó escutava. Não. Não é a Joyce. Nem a cronista de coluna social que fez uma revista com o próprio nome. Nada disso, Joyce é o cara que escreveu Ulisses. Como assim você não leu Ulisses? Ãhn? Saia daqui, você está por fora!

Não. Ainda não. Ulisses não é aquele velhinho que aparece nas fotos de políticos antigos e que seu pai diz que poderia ter sido presidente. Não. Ulisses poderia ser o personagem daquele filme B italiano que você já viu na sessão da tarde. Sim, ele tinha que lutar contra muitos monstros pra sair fora de uma roubada com muitas aventuras no mar e uma sereia que era da pesada, não é? Mas não é também. Ulisses é o livro que todos leram. Todos que interessam. Todos menos eu. E você. Não se preocupe. Deixe ele e Joyce, James, o escritor, pra quem entende. Ninguém.

Voltando ao assunto de hoje, claro que você deve ter lido ou tentado ler algo que Machado de Assis escreveu. Tem ótimos contos, eu gosto do Alienista, tem gente que odeia, mas faz tanto tempo que li que não lembro mais se gosto, livros modernos pra época, imaginem que o cara escrevia capítulos curtos na primeira pessoa (oh, que novidade, mas na época era quase um herege, tipo, Joachim Proenix, tá ligado?), e chatices memoráveis. Sinceramente, eu tento ler Capitu e quero que ela vá tomar no cu. É uma história de amor e cornitude e neguinho transforma em tratado da humanidade? Não existem tratados sobre a humanidade. Megalomania de professores que não fodem direito. Existem histórias. Algumas bem contadas.

Mas é essencial para ser pop que você assassine o Machado de Assis que existe em você. Esqueça. Não caia em seus paradigmas. Não o cite. Não se prenda a ele. Mesmo finja que você nunca leu nenhuma linha dele. Por final, se quiser realmente provocar, odeie Machado de Assis.


Resumindo, deixe as batatas para os machadianos.

Você perdeu.

Você é pop.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Literatura Pop

Claro, você pode se perguntar, quem é este carinha para falar de literatura pop se eu nem sei quem ele é, não é? Pois é. Aí que está o começo. Para ser pop não é necessariamente preciso ser conhecido. Basta estar inserido dentro da cultura pop. Conhecido já entra em outra classificação, a de famoso. Outra hora falaremos dos famosos. Por enquanto hoje falaremos do que quero dizer com literatura pop.

Literatura é literatura. Simples. Assim como música é música. Uso a música como parâmetro pois é a arte que mais atrai, apesar de eu não ser músico e nem ser capaz de tocar aceitavelmente qualquer instrumento musical. Mas a música escrita por um grande compositor 200 ou 300 anos atrás é tão música quanto a que o seu vizinho faz agora estourando os seus ouvidos. A diferença está na qualidade, obviamente, mas também a diferença está em quem cria a diferença. A música era presa a poucos quando surgiram aparelhos que reproduzissem música. Assim negros que colhiam algodão puderam propagar para lugares que jamais imaginaram ter suas músicas ouvidas. O que mudou foi a distribuição. E quando a distribuição se alterou por conta da tecnologia, o que antes nem se sabia que existia, agora era música. Simplificando e resumindo, é isso.

A literatura até a alfabetização em massa dos grandes centros populacionais era algo restrito a poucos. Mas, mesmo assim, uma rádio propaga música para milhares, milhões, e pelo preço de algumas pilhas, enquanto a literatura fazia com que o leitor tivesse que procurar o livro. O livro tinha que ser impresso. Distribuído. Vendido. Digo tinha porque também a literatura está tendo a sua distribuição alterada numa velocidade cada vez maior. Obviamente isso cria quebras de protocolos rígidos que foram impostos por séculos de preconceitos. A literatura não é para qualquer um, dirá um escritor mais clássico. Sim, assim também diziam os músicos ao ouvir os brancos que piravam no jazz ou os negros que pululavam no blues rural norte-americano ou enclausurados intelectuais ao escutar populares dançando em uma roda de samba.

Daqui a pouco você poderá se perguintar. Peraí, esse cara vai dizer que música sertaneja é música. É. Se não é o do teu gosto, foda-se, mas música é. Assim como literatura é tudo aquilo que ao se propagar é lido como ficção e aceito pelo público. Sim. Pelo público. Claro que vai ter gente trancada em casa escutando música eletrônica baseada em algoritmos. É música? Também é. Mas certamente terão aqueles que dirão: Isto é música, isto não é. Não lhe dêem créditos! A propagação em massa nos traz o que é potencialmente bom e o que é potencialmente péssimo. Mas é a propagação que nos faz ter o direito de escolha. Não deixem que outros escolham por vocês. Nem o que vocês devem ler e nem o que devem escrever.

A literatura pop parte deste princípio. Propagar. Propagar literatura urbana contemporânea fora dos padrões da classe média que a propaganda quer nos fazer engolir. A classe média desesperada. A classe média consumida no meio de uma montanha de conceitos, de falácias e de destruição de valores atemporais. É um mundo sem perspectivas onde o que nos resta é a procura do outro. A procura da sobrevivência. A procura de um amor verdadeiro e icônico que no fim vai ser desmontado pela própria iconoclastia da literatura pop. Parece confuso? É. Esqueça tudo o que sabe. Basta saber escrever. Assim como para fazer música é preciso saber tocar bem um instrumento, mesmo que vocês não gostem da música que tocam, para ser um escritor pop é preciso saber escrever bem. Se o resultado não for do gosto de ninguém e nem popular, foda-se. Não se assuste com as palavras que vierem dos "entendidos". Serão apenas palavras fascistas de quem quer criar um mundo próprio de mentiras e regras. Não existem regras. Quer dizer, existem. Mas não as respeite. Isso é ser pop.