segunda-feira, 12 de março de 2012

MALDITA CHAMPANHA - Capítulo 4

Capítulo 4

Chega toda torta ao estacionamento, ainda tentando pateticamente, como fazem quase todas as mulheres acostumadas a andarem de salto, andar com o do salto quebrado mais alto para compensar a altura do salto bom. Na portaria do estacionamento o funcionário a observa atento, talvez também porque no andar a bunda rebole de um modo diferente. Marina nota. Que que é? Mas quando vai buscar o que seria a bolsa se conta que tem um celular na mão. Por acaso tu não tem um tipo de chave mestra para abrir carro, não é? Não. Claro que não. Teu carro se fecha pelo alarme e a chave e o alarme reservas estão trancados em casa junto com o tal João. Inclusive a tua chave de casa está na bolsa. Teus cartões de crédito, teus trocados que tu usa para comprar cigarro quando fica nervosa e volta a fumar, teu lubrificante. Ai, que ódio, meu lubrificante. Ela fica vermelha na frente do funcionário do estacionamento que se chama Everaldo e mora em Alvorada.

Everaldo sai todos os dias de casa e pega dois ônibus para chegar ao trabalho. Ele gosta de seu trabalho. Carro de madame, de gente fresca como ele mesmo diz, e que muitas vezes deixam assim na hora de pagar, quando não pagam na maquininha do cartão. Chega em casa nove da noite e assiste à novela junto com a mulher, Silvana, que trabalha de faxineira em um condomínio no Menino Deus. Seus dois filhos estudam num colégio público estadual, nem bom, nem ruim, igual aos outros, de mediano para medíocre. Quase nunca acontece algo fora da rotina. Quando acontece é coisa do tipo essa madame aí, caminhando capenga e esquisita e que, vamos ser sinceros, tem uma bunda razoável, nada melhor que a minha nega, claro, que tem um super bundão e eu gosto é de bunda grande. Mas que essa capengada deixou a madama mais gostosa, isso deixou. Ele sorri e responde. Não senhora. Não tem como abrir o carro e nós não abrimos carros. A senhora tem que chamar um chaveiro ou tentar com a chave reserva.

Marina pulos de ódio e finalmente consegue se equilibrar. Quebrou o outro salto. Ela pede uma cadeira para se sentar. Everaldo traz uma cadeira daquelas de guarda de rua. Aquelas que alguém deu antes que o caminhão do Mensageiro da Caridade levasse embora. Tirou um sapato. Depois o outro e ficou com as pernas dobradas pra dentro, os pés se tocando, encurvada, pensando no que fazer. Tem um cigarro? Claro que tem. Todo guarda, segurança, o que seja, sempre tem um. A marca era daqueles mata-ratos com embalagens horríveis mas a propaganda anti-fumo atrás era do "Ministério da Saúde adverte: fumar pode causar pau mole." Não era isso, mas era o que Marina desejava. Que o desgraçado do peludo infeliz que ela nem se lembrava como era broxasse pelo resto de sua vida de aproveitador de mulheres com amnésia de champanha. Deu duas tossidas e tragou mais forte o mata, quer dizer, o cigarro de Everaldo. Se levantou, pegou os dois sapatos e entregou para ele. Por favor, joga estas porcarias no lixo? Obrigada. E me mais um desses? Ainda tenho que encarar o chefe.


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