terça-feira, 6 de março de 2012

MALDITA CHAMPANHA - Capítulo 2

"But he can't be a man 'cause he doesn't smoke
The same cigarettes as me"
Capítulo 2

Os espanhóis chegam, são três, um mais velho, todos bem arrumados, o mais novo tem cara de bunda de nenê, o mais ou menos é o mais bonito, se bem que o quarentão não é de se jogar fora. Ficaria com o quarenteza, levaria o do meio prum fim de semana em Santa mas de jeito nenhum comeria o cara de bebezinho. Odeio cara de baby, pensou Marina. Aquela carinha lavada, barbinha rala ou sem barba. Prefiro um homem firme, de preferência. Um homem de posição, ainda mais se for por baixo, a que eu mais gosto. Pára, Marina! Tu tem um homem chamado João trancado dentro de casa que tu não sabe se trepou ou não, sem celular, sem chave e, quem sabe, sem roupa. Será? Será que era gostoso? Será que eu fiz de tudo? Marina instintivamente juntou o indicador ao polegar e fez menção de levar à boca num movimento reflexo de quem procura pentelho entre os dentes e se conta que está em uma sala de reuniões, com três espanhóis, um gostoso, pára, Marina!

O banco espanhol comprou muitos bancos regionais. O do nordeste, do sudeste e de não sei mais qual este ou aquele estado, são 27 estados, muitos, e sei que também comprou uns da Argentina, o que deve ser bem melhor. Me lembram Buenos Aires e Palermo. Tantas lojinhas. Liquidações. Roupas. Brechós. Vinho até tarde e argentinos com corpos de deuses gregos. Moraria lá, com certeza. Era me pagarem um salário de brasileira, claro. Amor não é tudo na vida, guria. Não é, Marina? Era o chefe Cocó, quer dizer, Paulo, chamando Marina para continuar a explanação após sua introdução administrativa da proposta que tinha a apresentar para um novo plano de ações de marketing do banco. Marina apresentaria a parte prática do plano. Publicitária. Experiente, mas nem tanto que eu não sou uma velha! Marina declama a fala decorada que nem imaginava lembrar de ressaca, ou amnésia, ou sabe o que colocaram na minha champanha. Imagina em como vai tirar o tal João de lá, olha para um ponto vago qualquer, um tufo de cabelos grisalhos no alto da cabeça do espanhol quarentão, e então ele lhe sorri. Ela pára. O do meio se ajeita na cadeira. O cara de bunda faz que é cego enquanto Paulo faz sinais com a mão no peito. Marina olha para baixo e nota sua mão direita dentro da blusa. Para ser mais específica, em cima do meu peito, um dedo sobre o outro apalpando o mamilo. O espanhol gostoso, quer dizer, o nem moço e nem coroa, me pisca o olho. Termino minha apresentação e volto a sentar. Sem a mão no peito claro. Os espanhóis fazem uma ou duas perguntas para Paulo e logo depois se retiram. Era uma reunião inicial. Talvez daqui a alguns dias voltem com dúvidas ou simplesmente nunca mais voltem.

Depois de saírem volto à minha mesa e o celular pisca avisando mensagens de ligações não atendidas. Três ligações. Meia hora e o animal me liga três vezes? Ele acha que eu não faço nada da vida? Quando vai pegar o celular para ligar de volta, Paulo se aproxima da mesa. Meu deus, vou levar a maior xixizada do século, agora. Marina! que foi aquilo? Marina balbucia. Aquilo o que? Aquela mão? Aquela mão, Marina? Não me lembro de ver Cocó tão feliz assim faz tempo. Aquilo foi demais, Marina! Demais! Os caras saíram cochichando mas pude escutar entre outras frases que nunca tinham visto uma apresentação tão quente e interessante quanto a sua. Tu devia usar mais desse expediente, digamos, sensual. Sensual? Eu nem vi o que fazia. Pensava em como tirar um homem que não conheço de dentro da minha casa e minha mão foi parar nos mamilos. Vai saber se não era exame de toque? Marina coloca a mão no seio de novo. Paulo ri alto. Isso! É demais. uma mulher como tu pra ter uma idéia dessas, Marina. Como eu o que? Doida? Puta? Safada? Mal comida? Paulo se abaixa e me um beijo na bochecha e sai cantarolando uma letra inaudível dos Stones, Satisfaction eu acho. Preciso ligar para o tal João, quer dizer, para casa. Mas antes tenho que procurar um chaveiro para me tirar dessa. Um na internet. Sem que ninguém saiba. Ninguém daqui da empresa. Pela janela aberta do corredor entra um vento mais forte. Porto Alegre está ficando nublada às dez da manhã. Uma rajada mais forte faz com que a janela bata com força. Marina digita a palavra mágica no navegador quando PUF! Cai a luz!

Como assim? Cai a luz? Pega o celular e liga para casa. Atende, atende. Alô? João? Seguinte, caiu a internet aqui e eu não consegui achar um número. Não tem nenhum na geladeira? Um ímã? Um guia telefônico? Alô? Alô? O que? Bate o celular na mesa. Vai ver faltou luz também. Bosta de cidade ventosa. Porcaria de vento, de empresa de energia elétrica, de governo. Diabo de festa. Espanhóis. Reunião. Chefe. Que todos se explodam. Marina se vira para outro lado e avisa um colega que precisa ver se deixou seu carro mal estacionado. Mentira. Ele também sabe que é mentira. Mas quem se importa? Ele se importa? Ele tem um João peludo trancado em casa pós-trago de festa putaria em casa? Não, né?

 

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